‘DIABO LOIRO’: Curraisnovense é considerado a lenda do Vale-Tudo no Brasil
No início da década de 40, nascia em uma comunidade rural de Currais Novos um galego franzino, que mais tarde se tornaria o imbatível “Diabo Louro”, virando a sensação de todos os tempos do vale-tudo, hoje MMA (Artes Marciais Mistas). Poucas pessoas em sua cidade natal conhece a sua história. Euclides nasceu na comunidade Malhada Limpa, em 7 de maio de 1941, e muito cedo perdeu os pais. Passou uma temporada com o padrinho Monsenhor Paulo Herôncio, que o enviou para estudar no colégio Salesiano, em Natal. Posteriormente, o menino “briguento” foi transferido para Fortaleza, onde aprendeu o ofício de marceneiro, mas sem muita vocação para os estudos, foi parar em Recife, onde sua vida tomaria um outro rumo. Em frente a uma pensão que morava, uma academia do mestre Jurandir Moura, responsável por incorporar o Jiu-Jitsu no Nordeste, chamou sua atenção. Um convite dos filhos de Jurandir, que também moravam na pensão, foi o suficiente para levá-lo ao mundo do vale-tudo.
Euclides Pereira começou a lutar em 1958, aos 19 anos, e dedicou 25 anos da sua vida aos ringues. Segundo os relatos, lutou 530 vezes sem perder um único embate. Com pouco mais de 70 quilos e 1,75m, enfrentou e venceu oponentes com quase o dobro do peso. Sua fama começou na TV Ringue Torre, em Recife, onde começou como segurança, e depois de uma luta de apresentação, virou sensação. Todas as segundas-feiras ele desafiava um lutador e lá se foram mais de 100 lutas sem jamais ser derrotado. O programa acabou em 1966, mas Euclides já era um fenômeno. Percorreu quase todo o Brasil enfrentando adversários de todos os tipos: “Eu era chamado para lutar e muitas vezes nem sabia quem era, na hora eu resolvia”, disse o campeão, que venceu lutadores conhecidos como Ivan Gomes, Dedy Balbino, Waldemar Santana, Rei Zulu, King Kong e Takeo Yano, entre outros, terminando sua carreira invicto.
O segredo de Euclides na hora de criar o seu estilo “Vale-Tudo Nordestino”, foi se aperfeiçoar unindo várias artes marciais, além do Jiu-jitsu, boxe, capoeira, Karatê, luta livre e judô, hoje essa junção é chamada de “cross-training”, e ele já praticava na década de 60.
A Bahia sempre lhe trouxe ótimas conquistas. Foi na “Terra de Todos os Santos”, que conheceu sua esposa Vânia Simões, com quem teve três filhos e viraria sua fiel escudeira na sua carreira. Foi em Salvador também, no ginásio da Fonte Nova, que ele fez a sua principal luta da carreira, considerada épica pelos amantes do MMA, enfrentando Carlson Gracie, da família Gracie, famosa no mundo todo por dominar a arte do jiu-jitsu. No dia 6 de setembro de 1968, após quase perder a luta por estrangulamento, Euclides reagiu e depois de três rounds, o “Diabo Loiro” venceu, com folga, por pontos, o até então imbatível “Garoto de Ouro” da família Gracie, se consagrando e virando, em definitivo, um mito. “Ele nunca reconheceu a derrota, chegou no Rio de Janeiro dizendo que tinha sofrido um acidente de carro, e eu queria a revanche, mas ele nunca aceitou”, disse Euclides.
Após as conquistas no Nordeste, o curraisnovense, através de um amigo, o Índio, seguiu para a recém-inaugurada Brasília, onde arrumou um emprego no Senado e enfrentou nomes de peso, como Waldemar Santana. Segundo ele, apesar do enorme sucesso não ganhou dinheiro com vale-tudo, e devido a isso, chegou a passar por dificuldades financeiras. “Eu era muito ingênuo, fechava os contratos de boca e no final ninguém pagava. Só a luta com Carlson Gracie rendeu R$ 23 milhões, até hoje espero o dinheiro”, falou.
Euclides Pereira aposentou-se do vale-tudo aos 40 anos, com a mesma arma usada na primeira luta: uma guilhotina, contra Hércules. Fã assumido do UFC, é um admirador dos lutadores Anderson Silva, Minotauro, Júnior Cigano e Lyoto Machida, lutadores que segundo ele, tem o seu estilo de luta. O campeão, hoje com 76 anos, curte a aposentadoria em Brasília, onde mora com a esposa desde 1970.
Ele revelou para nossa Revista, que nunca largou as artes marciais. Continua treinando e também dando palestras. Há dez anos visitou sua terra natal, e tem vontade de voltar, mas sob uma condição: quando chover.